sexta-feira, 17 de abril de 2009

EM BUSCA DE SENTIDO

UM PSICOLOGO NO CAMPO DE CONCENTRAÇAO
Autor: Viktor E. Frankl (1905-1997).
Editora: Sinodal e Co-editora Vozes
Assunto: Ensaio psicológico
Edição: 18ª
Ano: 1991
Páginas: 137
Nota 1: Em 2006 já foi editada a 22ª edição
Nota 2: Ao final você encontrará dois vídeos: uma palestra sobre Viktor Frankl e uma entrevista do próprio Viktor Frankl [A descoberta de um sentido no sofrimento], legendada.

Sinopse: Viktor E. Frankl descreve, nesta obra, como se sentiu e observou a si mesmo e as demais pessoas e seu comportamento na situação-limite e como foi a sua própria experiência em busca do sentido da vida num campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial. Ao fazê-lo, toca na essência do que é ser humano: usar a capacidade de transcender uma situação extremamente desumanizadora, manter a liberdade interior e, desta maneira, não renunciar ao sentido da vida, apesar dos pesares. Na segunda parte do livro, apresenta os Conceitos Fundamentais da Logoterapia.


Comentários: Um livro sobre uma verdadeira lição de vida! Uma obra de observação psicológica, ao mesmo tempo, um testemunho da grande humanidade, capaz de animar ainda hoje pessoas que, em situações aparentemente sem sentido, ficam abertas para os pequenos sinais de sentido perceptíveis no dia-a-dia. Tais sinais tornam-se frestas pelas quais podemos vislumbrar o sentido mais profundo e transcendente da vida.


Há na vida do Viktor um episódio famoso, em que ele não sabia se ia estudar nos EUA, que era o que ele queria fazer, ou se ficava na Alemanha com os pais que estavam velhinhos. Aconteceu, então, de ele encontrar uma pedra que havia caído de uma sinagoga, onde estava gravado o mandamento “honrar pai e mãe”, e ele entendeu aquilo como uma mensagem de Deus para que ele ficasse com os pais. Tendo permanecido com os pais, acabaram todos num campo de concentração.


Poderia parecer que dentro do projeto de vida dele isso foi uma desgraça, uma ruptura, um elemento fortemente opositivo que apareceu para destruir todos os seus sonhos, mas na verdade o que aconteceu foi exatamente o contrário, porque toda a substância da investigação médica a que Viktor Frankl se dedicaria pelo resto da vida foi dada pela experiência que ele teve no campo de concentração. E a pergunta que ele fez, e que orientou a sua investigação, o seu estudo, repetia de algum modo a mesma experiência que ele estava vivendo: “Por que algumas pessoas resistem bem à experiência do campo de concentração e saem de lá até fortalecidas, enquanto outras desabam, são totalmente destruídas?” Ou, em outras palavras: “Se a situação é a mesma para todos nós, por que uns reagem de uma maneira e outros reagem de outra?” Essa pergunta pode ser transposta, transformada algebricamente em uma outra ainda: “Por que em alguns indivíduos o fator unificante prevalece, e em outros o fator dispersante é o que acaba ganhando?” Era, portanto, exatamente o mesmo problema que ele estava tentando resolver, ou seja, como é que ele perseveraria na sua vocação em uma situação que parecia não só hostil, mas absolutamente antagônica. Como é que alguém vai poder se realizar, fazer uma carreira médica dentro do campo de concentração? Uma carreira de cientista, de acadêmico, seria impossível dentro de um campo de concentração; na verdade, porém, o que parecia ser mais oposto e mais hostil acabou não só ajudando como dando a inspiração a ele.


Isso mostra que se você estiver firmemente disposto a ser quem você quer ser, e se você não ficar contando sempre com circunstâncias favoráveis, mas aceitar de bom coração as circunstâncias desfavoráveis e tentar sempre integrá-las e negociar com elas, você acaba absorvendo todos esses elementos.


Comentário de Olavo de Carvalho: A mensagem de Viktor Frankl. No dia 2 de setembro [de 1997] morreu, aos 92 anos, um dos homens realmente grandes deste século. Acabo de escrever isto e já tenho uma dúvida: não sei se o médico judeu austríaco Viktor Frankl pertenceu mesmo a este século. Pois ele só viveu para devolver aos homens o que o século XX lhes havia tomado - e não poderia fazê-lo se não fosse, numa época em que todos se orgulham de ser "homens do seu tempo", alguém muito maior do que o século.


Viktor Emil Frankl, nascido em Viena em 26 de março de 1905, foi grande nas três dimensões em que se pode medir um homem por outro homem: a inteligência, a coragem, o amor ao próximo. Mas foi maior ainda naquela dimensão que só Deus pode medir: na fidelidade ao sentido da existência, à missão do ser humano sobre a Terra.

Homem de ciência, neurologista e psiquiatra, não foi o estudo que lhe revelou esse sentido. Foi a temível experiência do campo de concentração. Milhões passaram por essa experiência, mas Frankl não emergiu dela carregado de rancor e amargura. Saiu do inferno de Theresienstadt levando consigo a mais bela mensagem de esperança que a ciência da alma deu aos homens deste século.


O que possibilitou esse milagre singular foi a confluência oportuna de uma decisão pessoal e dos fatos em torno. A decisão pessoal: Frankl entrou no campo firmemente determinado a conservar a integridade da sua alma, a não deixar que seu espírito fosse abatido pelos carrascos do seu corpo. Os fatos em torno: Frankl observou que, de todos os prisioneiros, os que melhor conservavam o autodomínio e a sanidade eram aqueles que tinham um forte senso de dever, de missão, de obrigação. A obrigação podia ser para com uma fé religiosa: o prisioneiro crente, com os olhos voltados para o julgamento divino, passava por cima das misérias do momento. Podia ser para com uma causa política, social, cultural: as humilhações e tormentos tornavam-se etapas no caminho da vitória. Podia ser, sobretudo, para com um ser humano individual, objeto de amor e cuidados: os que tinham parentes fora do campo eram mantidos vivos pela esperança do reencontro. Qualquer que fosse a missão a ser cumprida, ela transfigurava a situação, infundindo um sentido ao nonsense do presente. Esse senso de dever era a manifestação concreta do amor - o amor pelo qual um homem se liberta da sua prisão externa e interna, indo em direção àquilo que o torna maior que ele mesmo.


O sentido da vida, concluiu Frankl, era o segredo da força de alguns homens, enquanto outros, privados de uma razão para suportar o sofrimento exterior, eram acossados desde dentro por um tirano ainda mais pérfido que Hitler - o sentimento de viver uma futilidade absurda.


Frankl tinha três razões para viver: sua fé, sua vocação e a esperança de reencontrar a esposa. Ali onde tantos perderam tudo, Frankl reconquistou não somente a vida, mas algo maior que a vida. Após a libertação, reencontrou também a esposa e a profissão, como diretor do Hospital Policlínico de Viena.

Assim ele registra, no seu livro Man's Search for Meaning, uma das experiências interiores que o levaram à descoberta do sentido da vida:


"Um pensamento me traspassou: pela primeira vez em minha vida enxerguei a verdade tal como fora cantada por tantos poetas, proclamada como verdade derradeira por tantos pensadores. A verdade de que o amor é o derradeiro e mais alto objetivo a que o homem pode aspirar. Então captei o sentido do maior segredo que a poesia humana e o pensamento humano têm a transmitir: a salvação do homem é através do amor e no amor. Compreendi como um homem a quem nada foi deixado neste mundo pode ainda conhecer a bem-aventurança, ainda que seja apenas por um breve momento, na contemplação da sua bem-amada. Numa condição de profunda desolação, quando um homem não pode mais se expressar em ação positiva, quando sua única realização pode consistir em suportar seus sofrimentos da maneira correta - de uma maneira honrada -, em tal condição o homem pode, através da contemplação amorosa da imagem que ele traz de sua bem-amada, encontrar a plenitude. Pela primeira vez em minha vida, eu era capaz de compreender as palavras: 'Os anjos estão imersos na perpétua contemplação de uma glória infinita'."


Frankl transformou essa descoberta num conceito científico: o de doenças noogênicas. Noogênico quer dizer "proveniente do espírito". Além das causas somáticas e psíquicas do sofrimento humano, era preciso reconhecer um sofrimento de origem propriamente espiritual, nascido da experiência do absurdo, da perda do sentido da vida: "O homem, dizia ele, pode suportar tudo, menos a falta de sentido."


Das reflexões de Frankl sobre a experiência do absurdo nasceu um dos mais impressionantes sistemas de terapia criados no século dos psicólogos: a logoterapia, ou terapia do discurso - um conjunto de esquemas lógicos usados para desmontar os subterfúgios com que a mente doentia procura eludir a questão decisiva: a busca do sentido.

Mas o sentido não teria o menor poder curativo se fosse apenas uma esperança inventada. A mente não poderia encontrar dentro de si a solução de seus males, pela simples razão de que o seu mal consiste em estar fechada dentro de si, sem abertura para o que lhe é superior. Em vez de criar um sentido, a mente tem de submeter-se a ele, uma vez encontrado. O sentido não tem de ser moldado pela mente, mas a mente pelo sentido. O sentido da vida, enfatiza Frankl, é uma realidade ontológica, não uma criação cultural. Frankl não dá nenhuma prova filosófica desta afirmativa, mas o caminho mesmo da cura logoterapêutica fornece a cada paciente uma evidência inequívoca da objetividade do sentido da sua vida. O sentido da vida simplesmente existe: trata-se apenas de encontrá-lo.

Universal no seu valor, individual no seu conteúdo, o sentido da vida é encontrado mediante uma tenaz investigação na qual o paciente, com a ajuda do terapeuta, busca uma resposta à seguinte pergunta: Que é que eu devo fazer e que não pode ser feito por ninguém, absolutamente ninguém exceto eu mesmo? O dever imanente a cada vida surge então como uma imposição da estrutura mesma da existência humana. Nenhum homem inventa o sentido da sua vida: cada um é, por assim dizer, cercado e encurralado pelo sentido da própria vida. Este demarca e fixa num ponto determinado do espaço e do tempo o centro da sua realidade pessoal, de cuja visão emerge, límpido e inexorável, mas só visível desde dentro, o dever a cumprir.
Em vez de dissolver a individualidade humana nos seus elementos, mediante análises tediosas que arriscam perder-se em detalhes irrelevantes, a logoterapia busca consolidar e fixar o paciente, de imediato, no ponto central do seu ser, que é, e não por coincidência, também o ponto mais alto. Eis aí por que é inútil buscar provas teóricas do sentido da vida: ele não é uma máxima uniforme, válida para todos - é a obrigação imanente que cada um tem de transcender-se. Discutir o sentido da vida sem realizá-lo seria negá-lo; e, uma vez que começamos a realizá-lo, já não é preciso discuti-lo, porque ele se impõe com uma evidência que até a mente mais cínica se envergonharia de negar.

A logoterapia tem uma imponente folha de sucessos clínicos. Porém mais significativa do que suas aplicações médicas talvez seja a função que ela desempenhou e desempenha - a missão que ela cumpre - no panorama da cultura moderna. Num século que tudo fez para deprimir o valor da consciência humana, para reduzi-la a um epifenômeno de causas sociais, biológicas, lingüisticas, etc., Frankl nadou na contracorrente e ninguém conseguiu detê-lo. Ninguém: nem os guardas do campo nem as hostes inumeráveis de seus antípodas intelectuais - os inimigos da consciência. Frankl apostou no sentido da vida e na força cognoscitiva da mente individual. Apostou nos dois azarões do páreo filosófico do século XX, desprezados por psicanalistas, marxistas, pragmatistas, semióticos, estruturalistas, desconstrucionistas - por todo o pomposo cortejo de cegos que guiam outros cegos para o abismo. Apostou e venceu. A teoria da logoterapia resistiu bravamente a todas as objeções, sua prática se impôs em inúmeros países como o único tratamento admissível para os casos numerosos em que a alma humana não é oprimida por fantasias infantis mas pela realidade da vida. Por isto mesmo a crítica cultural de Frankl, parte integrante de uma obra onde o médico e o pensador não se separam um momento sequer, tem um alcance mais profundo do que todas as suas concorrentes. Desde seu posto de observação privilegiado, ele pôde enxergar o que nenhum intelectual deste século quis ver: a aliança secreta entre a cultura materialista, progressista, democrática, cientificista, e a barbárie nazista. Aliança, sim: seria apenas uma coincidência que o século mais empenhado em negar nas teorias a autonomia e o valor da consciência também fosse o mais empenhado em criar mecanismos para dirigi-la, oprimi-la e aniquilá-la na prática? Dirigindo-se a um público universitário norte-americano, Viktor Frankl pronunciou estas palavras onde a lucidez se alia a uma coragem intelectual fora do comum:

"Não foram apenas alguns ministérios de Berlim que inventaram as câmaras de gás de Maidanek, Auschwitz, Treblinka: elas foram preparadas nos escritórios e salas de aula de cientistas e filósofos niilistas, entre os quais se contavam e contam alguns pensadores anglo-saxônicos laureados com o Prêmio Nobel. É que, se a vida humana não passa do insignificante produto acidental de umas moléculas de proteína, pouco importa que um psicopata seja eliminado como inútil e que ao psicopata se acrescentem mais uns quantos povos inferiores: tudo isto não é senão raciocínio lógico e conseqüente." (Sêde de Sentido, trad. Henrique Elfes, São Paulo, Quadrante, 1989, p. 45.)

Com declarações desse tipo, ele pegava pela goela os orgulhosos intelectuais denunciadores da barbárie e lhes devolvia seu discurso de acusação, desmascarando a futilidade suicida de teorias que não assumem a responsabilidade de suas conseqüências históricas. Pois o mal do mundo não vem só de baixo, das causas econômicas, políticas e militares que a aliança acadêmica do pedantismo com o simplismo consagrou como explicações de tudo. Vem de cima, vem do espírito humano que aceita ou rejeita o sentido da vida e assim determina, às vezes com trágica inconseqüência, o destino das gerações futuras.

Frankl era judeu, como foram judeus alguns dos criadores daquelas doutrinas materialistas e desumanizantes que prepararam, involuntariamente, o caminho para Auschwitz e Treblinka. Se ele pôde ver o que eles não viram, foi porque permaneceu fiel à liberdade interior que é a velha mensagem do Sentido em busca do homem: "SE ME ACEITAS, Israel, Eu sou o Teu Deus."


Trecho do livro: “Dostoievski afirmou certa vez: ´Temo somente uma coisa: não ser digno do meu tormento´. Essas palavras ficavam passando muitas vezes pela cabeça da gente quando se ficava conhecendo aquelas pessoas cujo comportamento no campo de concentração, cujo sofrimento e morte testemunham essa liberdade interior última do ser humano, a qual não se pode perder. Sem dúvida, elas poderiam dizer que foram ´dignas dos seus tormentos´. Elas provaram que, inerente ao sofrimento, há uma conquista, que é a conquista interior. A liberdade espiritual do ser humano, a qual não se lhe pode tirar, permite-lhe, até o último suspiro, configurar a sua vida de modo que tenha sentido (...) Se é que a vida tem sentido, também o sofrimento necessariamente o terá.”


Breve Biografia: Viktor E. Frankl, M.D., Ph.D. (26/3/1905-2/9/1997) foi professor de Neurologia e Psiquiatria de Viena e também professor de Logoterapia na Universidade Internacional da Califórnia. É fundador da Logoterapia, muitas vezes chamada de “terceira escola vienense de psicoterapia” (as duas primeiras são: a Psicanálise de Freud e a Psicologia Individual de Adler). Lecionou ainda nas universidades de Harvard, Stanford, Dallas e Pittsburgh.
Frankl publicou 32 livros, que foram traduzidos para 27 línguas, incluído o japonês e o chinês. Além disso, foram publicados 151 livros sobre Frankl e sua obra por outros autores.
Esteve no Brasil em 1984.

PALESTRA: VIKTOR FRANKL E O SENTIDO DA VIDA

ENTREVISTA LEGENDADA

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