segunda-feira, 1 de outubro de 2012

DOIS AMORES, DUAS CIDADES

Autor: Gustavo Corção
Assunto: Filosofia da cultura
Editora: Agir
Edição: 1ª
Ano: 1967
Páginas: 281
 
Sinopse: A obra em dois volumes versa sobre os passos e as experiências do homem em busca de um mundo melhor ou em busca de si mesmo. Uma obra de referência para o conhecimento das experiências humanas, culturais e políticas, mais especialmente as experiências democratizantes. Tudo disposto em ordem histórica. O ângulo de abordagem é o da filosofia da cultura ou da política, com suprimentos pedidos à teologia.

Ao leitor (Gustavo Corção): Este livro talvez peque pela excessiva fluidez de seu objeto: os homens; ou, quem sabe, por sua excessiva nitidez: o homem. Ou ainda, e mais provavelmente, pelo entremeio de figuras alugadas aos historiadores e das considerações filosóficas em torno delas tecidas – tudo à procura de uma compreensão melhor do mesmo obsessivo e irritante objeto. Posso dizer que ele vem completar uma grande lacuna por mim mesmo deixada nos dez mil artigos de jornal. Aqui suponho que o leitor encontrará mais desenvolvidas e meditadas as idéias que explicam muita posição tomada, muito juízo feito sobre os fatos e os homens de nosso tempo, que na ocasião não pude fundamentar; e espero que encontre também um tom mais repousado e mais demonstrativo do amor que me move.

De um modo geral podemos dizer que este livro, nos seus dois volumes, versa sobre os passos e as experiências do homem em busca de um mundo melhor ou em busca de si mesmo. Poderia ter escolhido o título inspirado em Gauguin: “Qui sommes-nous? D’où venons-nous? Où allons-nous?” [“Quem somos nós? De onde viemos? Para onde vamos?”]. Preferi tirá-lo de Santo Agostinho, na Cidade de Deus, porque além de tantas interrogações esta obra pretende formular algumas afirmações. E uma delas é precisamente a que se acha condensada no título: dois amores, duas cidades. Ou mais claramente: o mundo, a ordem política, a civilização que está para cristalizar-se, dependem essencialmente, diretamente, do amor que tivermos. E não basta dizer do amor que tivermos para uso próprio em nossa vida particular; é preciso acrescentar: do amor que tivermos e que soubermos projetar, e que assim venha a construir o próprio tecido de um mundo novo que todos nós queremos menos egoísta e menos desumano.

A matéria desta obra são as experiências humanas, culturais e políticas, e mais especialmente as experiências democratizantes, dispostas em ordem histórica; o ângulo com que é considerada é o da filosofia da cultura ou da política, com suprimentos pedidos à teologia, como convém à filosofia adéquatement prise [devidamente tidas]. As partes mais abstratas estão dispostas segundo uma ordem que me pareceu mais didática: a da proximidade da aplicação. A rigor, cada volume por ser lido separadamente, mas o autor ousa esperar que alguns leitores tenham a energia para ler os dois volumes, a fim de aprenderem a síntese que eles propõem. Justamente por ser simples demais, a idéia principal que atravessa estas mil páginas precisa de amparo e do concurso de muitos fatores, precisa de uma mobilização geral de recursos, para livrar-se do lugar comum ou da palavra vazia.

Daí a necessidade de tantas páginas, de tantos assuntos, de tantas perspectivas que expõem esta obra ao risco de parecer-se com a tese de Pico de la Mirandola, intitulada “De omini re scibili” [“Os presságios do cognoscível”]; e ao risco ainda maior de merecer a crítica do leitor malicioso que acrescentou o subtítulo: “et quibusdam aliis” [“e certos outros”]. Não pretendo ter escrito sobre todas as coisas sabíveis, mas pretendo ter escrito, um pouco abundantemente, sobre algumas coisas que, normalmente, deveriam dispensar tamanho discurso.

O Autor

Orelhas do segundo volume: Quem quiser entender, menos superficialmente, as dores e esperanças dos tempos presentes, para entrever as promessas ou ameaças do futuro, terá de volver às experiências passadas, recapitular as buscas, os erros, as conquistas fecundas e as grandes expectações frustradas, tudo isto sentido como coisa passada e ao mesmo tempo atuante, perempta e atual. A genética da história, de que tanto se abusa para anunciar mutações, vale primeiro para assegurar continuidades. Para esse empreendimento vertiginosamente variado e denso é preciso possuir um sólido equipamento de princípios, critérios, eixos, que tenham força e firmeza para medir e julgar o movediço turbilhão de fatos e feitos que encheu os séculos.

É uma ousada tentativa desse gênero que nos traz esse novo livro de G.C. [Gilbert K. Chesterton] que certamente surpreenderá seu leitor habitual, e por mais forte razão aqueles que, a respeito desse autor, descansavam nas classificações definitivas. Ao longo de suas mil páginas, alternadas entre quadros pedidos aos historiadores e especulações às vezes árduas pedidas a filósofos e teólogos, para maior apuro dos princípios e dos critérios, este livro variado, ora exigente de atenção máxima, ora remunerador com agrados do estilo e das imagens, move-se todo na perseguição de uma estrela de Belém ou de uma idéia-luz de inspiração agostiniana, que transparece desde o título: dois amores e duas cidades. O mundo melhor que todos queremos depende de uma essencial opção entre dois amores, e da capacidade que tivermos de colocar tal escolha como constelação zodiacal do novo mundo. “Une nouvelle chrétienté demande à naitre”, diz Charles Journet. Este livro é a prolongada glosa dessa esperança.

Há na estrutura deste livro uma característica que forma certo contraste com a índole personalíssima do autor. Contra seus hábitos, o livro é carregado de citações, ou melhor, o livro é uma conversação onde falam vários autores, às vezes longamente. Não se trata de citações usadas para corroborar o pensamento do autor, mas de toda uma trama de contribuições postas em forma de autêntico diálogo. Trata-se pois de um livro escrito por uma centena de autores. É verdade que no meio das vozes harmoniosas há aqui e ali, como no teatro, passagens inteiras de algum vilão.

No segundo volume, sobretudo nos últimos capítulos, temos uma pungente exposição dos erros terríveis acumulados na Civilização Ocidental Moderna, desde a Renascença e a Reforma, e cobrados agora aos estupefatos habitantes do século XX. É nessa parte do livro que se adensa a contribuição que Gustavo Corção nos traz nesta obra que compendia as reflexões vividas e tantas vezes difundidas pelo autor, em artigos, conferências e aulas, nestes últimos dez anos (1967) A conclusão se chama Inconclusão e diz respeito às perplexidades e lutas do turvado presente. Teremos perdido a primeira batalha? Teremos avançado através da tortuosidade dos caminhos?

Nenhum comentário: