sábado, 16 de maio de 2009

ESPERANDO GODOT

Assista ao filme (completo) no final da sinopse!

Título original: En attendant Godot
Autor: Samuel Beckett (1906-1989)
Tradução: Fábio de Souza Andrade
Assunto: Drama
Editora: Cosac Naify
Edição: 1ª
Ano: 2005
Páginas: 237

Sinopse: Na história, dois vagabundos aguardam infinitamente, num descampado, a vinda do senhor Godot, que nunca aparece.

Dado este nó dramático, tão estrito que não permite peripécia, desfecho ou catarse, a espera e a angústia de Vladimir (Didi) e Estragon (Gogô), repetem-se ao infinito, ora como tragédia, ora como farsa.

Obs.: A expressão "Esperando Godot" era bastante utilizada em tempos passados para indicar algo impossível, ou uma espera infrutífera.

A obra: Trata-se de uma peça de teatro, escrita originalmente em francês, em 1949, e publicada em 1952. Em 1955 Samuel Beckett publicou a versão escrita em inglês.

O enredo: O enredo baseia-se na falta de comunicação entre os personagens e na pausa do silêncio da espera de algo que não se resolve.

A peça é dividida em dois atos. Nos dois atos, contracenam dois personagens: Vladimir e Estragon. Durante cada um dos atos, que são semelhantes na estrutura, surgem dois novos personagens: Pozzo e Lucky. Além destes, entra em cena no final de cada ato um garoto.

Em um lugar indefinido dois amigos se encontram: Estragon e Vladimir. A primeira frase dita na peça, por Estragon, já indica a inutilidade da presença deles naquele lugar:"nada a fazer". Eles lá se encontram para esperar um sujeito de nome Godot. Nada é esclarecido a respeito de quem é Godot ou o que eles desejam dele. Os dois iniciam um diálogo trivial que só será interrompido quando da entrada de Pozzo e Lucky. O aparecimento destes assusta os amigos, ainda mais pelo modo como os dois vêm: Pozzo puxa uma corda que na outra ponta está amarrada ao pescoço de Lucky. Lucky por sua vez carrega uma pesada mala que não larga um só instante. Entende-se pela situação que Pozzo é o patrão e Lucky seu criado. Os quatros trocam palavras, cada um com seu drama pessoal, até que Pozzo e Lucky saem. Em seguida, entra um garoto para anunciar que quem eles estão esperando - Godot - não viria hoje, talvez amanhã. Fim do primeiro ato.

O segundo ato é a cópia fiel do primeiro. O cenário é o mesmo, a menos da árvore que está um pouco diferente, com algumas folhas. Estragon e Vladimir voltam para esperar Godot, que talvez apareça nesse dia. Iniciam outro diálogo trivial, interrompido outra vez pela chegada de Pozzo e Lucky. Só que, inexplicavelmente, Pozzo está cego e Lucky está surdo. Dialogam. Após a partida destes, aparece um garoto (diferente do garoto do primeiro ato) anunciando que Godot não viria hoje, talvez amanhã. Pensam em se enforcar na árvore, mas desistem, ante a impossibilidade do ato ser simultâneo. O diálogo final, que encerra o ato e a peça é o seguinte:

Vladimir: - Então, devemos partir?Estragon: - Sim, vamos.Eles não se movem.

Análise da Obra: O que a peça significa? O prof. José Monir Nasser diz que a peça se cerca de grande mistério e poucas informações. Nós não sabemos quem é Godot, quem são os dois vagabundos Vladimir e Estragon, onde eles efetivamente estão, salvo que ao lado de uma árvore, sobre o que falam e porque esperam Godot que eles próprios não sabem. Tampouco sabemos muita coisa sobre Bozzo e Lucky ou sobre o menino. Enfim, tudo está envolvo num enorme mistério e muita desinformação.

Por essa razão, a peça apresenta inúmeras interpretações. Algumas sem sentido algum, outras equivocadas e outras com algum sentido, mas parcial.

Quem é Godot? Algumas especulações atribuem a God (Deus). Entretanto, o próprio Beckett proibiu, expressamente, essa interpretação alegórica, embora ele mesmo não tenha dado muita ajuda para interpretação da sua obra. A exemplo de Camus, Beckett não tinha muito interesse de ajudar os seus interlocutores sobre o que estava acontecendo ali.

Temos quatro personagens centrais – Vladimir (Didi), Estragon (Gogô), Pozzo e Lucky – e uma personagem secundária – o menino que aparece apenas como uma intervenção de que Godot existe.

As duplas Vladimir/Estragon são mais importantes, porque estão o tempo todo esperando Godot. A dupla Pozzo/Lucky, nunca espera Godot.

As duas duplas, Vladimir/Estragon e Pozzo/Lucky são diferentes. A primeira dupla é horizontal, ou seja, não há hierarquia entre seus elementos, enquanto a segunda é vertical, pois existe hierarquia entre Pozzo e Lucky.

O mais contrastante entre as duas duplas é a consciência. Não que a primeira dupla – Gogô/Didi – tenha a compreensão do que esteja acontecendo, mas eles têm uma preocupação maior. Por outro lado, Pozzo/Lucky não tem a mesma preocupação da primeira dupla.

Falando simbolicamente, na verdade, eles são quatro personagens centrais. A análise simbólica do “quatro” representa o resumo das possibilidades existenciais de qualquer coisa que seja.

O quatro representa:

- Os quatro Pontos cardeais (Norte, Sul, Leste e Oeste);
- As quatro Estações do ano (Primavera, Verão, Outono e Inverno);
- Os quatro Elementos da matéria (Água, Terra, Fogo e Ar);
- Os quatro Estados da matéria (Sólido, Liquido, Gasoso e Plasma);
- Os quatro Cavaleiros do apocalipse (Violência, Guerra, Fome e Morte);
- Os quatro Evangelistas (Marcos, Mateus, João e Lucas);
- Os quatro Temperamentos (Sanguíneo, Colérico, Melancólico e Fleumático)

Portanto, o quatro na peça não é mera coincidência, porque quando você olha para as possibilidades existenciais de alguma coisa, você olha para quatro direções, sempre.

Quando se olha para os quatro elementos, o Vladimir parece mais correlacionado ao elemento “Ar”. O Estragon parece correlacionado ao elemento “Água”. O Pozzo parece mais correlacionado com o elemento “Fogo” e o Lucky parece mais com o elemento relacionado a “Terra”.

Quando se olha para os quatro temperamentos, o Vladimir parece de temperamento “melancólico”, o Estragon parece o “fleumático”, o Bozzo parece “colérico” e o Lucky parece “sangüíneo”. De alguma maneira eles se encaixam, razoavelmente bem, nessa classificação dos quatro temperamentos.

Isso apenas para dar um exemplo de que essas quatro personagens podem ter aí um sentido simbólico por serem quatro e por serem quem são.

A simbologia da personagem ajuda mas não resolve o problema, porque no fundo continuamos não entendendo nada da história, mesmo que tenhamos sido capazes de perceber a simbologia dos quatro elementos e dos quatro temperamentos muito claramente nas quatro personagens existentes na peça.

Mas, se não esclarece tudo, pelo menos ajuda a concluir que esses quatro, de alguma maneira, representam como potência e como modelo a humanidade inteira. Esses quatro são uma descrição dos quatro tipos humanos possíveis, aqueles tipos básicos dos quais serão construídas as misturas hibridas. É como se essas quatro pessoas representassem um resumo, uma síntese da humanidade inteira.

Qual o problema que essas quatro personagens têm? Os problemas que eles têm são diferentes, mas de alguma maneira eles compartilham de um conjunto de problemas. Comecemos primeiro com a dupla Vladimir/Estragon, que são as personagens centrais da história.

Os dois estão num impasse o tempo todo: “Vamos embora?” – “Não, porque estamos esperando Godot”. Em nenhum momento acontece alguma coisa. Nunca nada dá certo. O resultado dessa vida humana que está aí, é a IMOBILIDADE, a INAÇÃO (falta de ação, indecisão, inércia).

INAÇÃO é o sinônimo de morte. Os gregos costumavam dizer que o inferno é um lugar frio e não um lugar quente. Porque é a frieza, a falta de calor e o gelo que são correspondentes a INAÇÃO e não o calor. O calor é o contrário, é extremamente produtivo, faz um automóvel andar, uma caldeira funcionar, as plantas crescerem. O frio, por sua vez, está associado com a pausa, silêncio, a perda de ação. Por isso que os antigos diziam que a morte está associada ao frio e não ao calor.

O resultado prático dos acontecimentos da peça é a PERDA DA AÇÃO, pois tudo que acontece é completamente inútil. Todos os acontecimentos geram NADA. Tudo fica na mesma, fica tido igual. Portanto, o resultado prático é a perda da capacidade de ação representada na última frase da peça: “Então, vamos embora.”“Vamos lá”. E eles não se mexem.

As personagens não são capazes de se mexer, de produzir algum ato que seja de fato capaz de gerar uma conseqüência qualquer. Eles gastam suas energias todas em: tirar o sapato e botar o sapato, bater no Lucky, tentar, inutilmente, levantar o Pozzo do chão. Essas atividades que eles fazem o tempo todo e não parece ser alguma atividade produtiva que tenha geração alguma concepção, a renovação de alguma coisa.

A concepção que temos é que tudo é mais ou menos inútil. Há uma sensação de desânimo permanente e sistêmico que passa por toda a peça.

O objetivo de Beckett foi transmitir à platéia a sensação de angústia que toda pessoa normal deveria sentir.

Eles esperam Godot, mas ele não vem. Eles continuam esperando sem saber quem é ele e sem saber para que o esperam. Há uma desesperança absoluta, uma sensação de que não há o que fazer, de que não se pode fazer nada de verdade. Eles transmitem à platéia a sensação de que tudo é inútil e nada tem sentido.

Portanto, a peça mostra um clima muito claro de desesperança, falta de sentido daquilo que eles estão fazendo.

Aristóteles, na “Poética” faz uma maravilhosa descrição que depois foi sistematizada por um grande crítico literário chamado Northrop Frye, no seu livro “Anatomia da Crítica”. Aristóteles dizia que, quando se estuda a personagem do herói (no conceito grego), pode-se classificá-lo em cinco graus de poder. Cada grau de poder é chamado de modo (expressão aristotélica).

Cinco Graus de Poder das Personagens:

1) Modo Mítico: é o poder da personagem divina. Só se aplica a alguém que não está no mundo humano. Ela pode fazer o que bem entender.

2) Modo Lendário: tem diferença de natureza em relação a personagem mítica, porque ela não é Deus, é um ser humano. Portanto, é um ser humano que é capaz de fazer coisas sobre-humanas, ou seja, muito acima da média do ser humano. Ex.: o profeta.

3) Modo Imitativo-alto: é aquele ser humano que tem como diferença com o anterior, menor intensidade de poder. Redução da intensidade do poder. Não fala com Deus, com pássaros, não faz clarividência. Não é tão poderoso quanto um profeta, mas é capaz de fazer coisas muito acima dos seres humanos normais.

4) Modo Imitativo-baixo: é o ser humano comum que é capaz de fazer coisas normais. Uma pessoa comum que é capaz de uma certa quantidade de ação. Somos nós.

5) Modo Irônico: está abaixo da média. Não consegue ter ação alguma sobre o mundo. Não consegue ter a mesma capacidade de se relacionar com o mundo como uma pessoa normal poderia. Ex.: Vítimas de uma situação, tramóia, conspiração etc. Prometeu é um exemplo típico de um sujeito Irônico. Raskolnikov começa como Imitativo-alto e termina como Irônico.
Nota: Não se trata da capacidade mental do indivíduo, mas sua capacidade de promover uma ação que possa mudar alguma coisa no mundo.

Didi e o Gogô são personagens tipicamente irônicos, o que significa que eles são incapazes de qualquer tipo de ação. Eles não conseguem nem saber qual é o dia da semana. Não são capazes nem de tirar um bota. Um deles está sempre querendo ir embora, mas ele esquece que estão esperando Godot. Ele não consegue lembrar nem a razão pela qual eles estão ali.

Por outro lado, o Pozzo é imitativo-baixo, enquanto o Lucky é irônico.

Vladimir e Estragon são personagens irônicas, porque o modo irônico é a base da literatura moderna, ou seja, esse lixo que está aí pululando nas prateleiras das livrarias e bancas de revistas.

Beckett quer nos mostrar com a peça “Esperando Godot”, o quanto o homem moderno está se tornando IRÔNICO.

É o sujeito que não consegue fazer nada mais. É como se houvesse um congelamento total do poder de ação humana, que está representado por essa idéia de,

- Vamos !
- Sim, vamos.

E ninguém sai do lugar.


GODOT NÃO É DEUS ! MAS É UMA POSSIBILIDADE DE SENTIDO EXISTENCIAL E “ESPERANDO GODOT” É UMA HISTÓRIA EXISTENCIALISTA.



Sobre o autor:
Dramaturgo, romancista e poeta irlandês, Samuel Beckett nasce em Dublin, Irlanda, no dia 13 de abril de 1906. Estuda na Portora Royal School, em Einiskillen, e depois no Trinity College, em Dublin. Em 1928 é nomeado lecteur de inglês na École Normale Supérieure de Paris e conhece James Joyce. A partir de 1945, começa a traduzir suas primeiras obras para o francês e a escrever poemas e novelas nessa língua. Samuel Beckett morre em 22 de dezembro de 1989, em Paris.
Samuel Beckett (Foto: 1932).



O FILME (COMPLETO E LEGENDADO)
 
 

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